Com a urgência global em mitigar os efeitos das mudanças climáticas, o setor de transportes é apontado como um dos principais responsáveis pelas emissões de gases de efeito estufa (GEE). 

No Brasil, onde o modal rodoviário ainda predomina, a ferrovia se apresenta como uma solução estratégica para promover uma mobilidade mais sustentável e eficiente. E mais do que isso: ela pode ser a grande locomotiva da transição energética nacional.

Para entender os caminhos e desafios dessa transformação, conversamos com Sandra Holanda, engenheira de produção e manutenção, mestre em Engenharia Mecânica, com 14 anos de experiência na Companhia Brasileira de Trens Urbanos. 

Ex-Secretária Nacional de Mobilidade e Desenvolvimento Urbano (2021-2023), Sandra hoje atua como consultora em Mobilidade Metropolitana e Projetos Metroferroviários, além de integrar o movimento Brazil on Rails, que busca conectar o setor ferroviário brasileiro ao mercado internacional, com foco no fortalecimento da infraestrutura e da indústria nacional.

Acompanhe tudo o que ela nos disse sobre o assunto nos parágrafos a seguir!

Ferrovias e ESG: vantagem comparativa

Segundo Holanda, o modal ferroviário já parte na frente quando o assunto é sustentabilidade. 

“Quando se trata de ESG, as ferrovias saem na frente e carregam vários benefícios em comparação a outros modais. Apesar disso, a emissão de gases de efeito estufa ainda é uma preocupação, especialmente em relação à frota de locomotivas a diesel”, pontua.

Entre as principais soluções tecnológicas em debate no setor estão as locomotivas híbridas e elétricas. 

Nas palavras de Holanda: “A eletrificação dos corredores ferroviários tem evoluído para locomotivas que combinam motores diesel e baterias, promovendo a redução de emissões. Ou baterias que garantem autonomia em velocidades e trechos maiores”.

Ela também destaca o uso de combustíveis alternativos, como o hidrogênio verde e os biocombustíveis, como apostas promissoras no processo de descarbonização do transporte ferroviário.

O papel da engenharia na eficiência energética

A engenheira ressalta, no entanto, que não basta pensar apenas na substituição de fontes de energia. 

“É importante pensar além das fontes alternativas, apesar delas serem o ponto focal do processo de descarbonização”, observa.

Ela prossegue: “Devemos considerar como a engenharia contribui, por exemplo, no projeto de motores mais eficientes no consumo do próprio diesel, ou na eficiência operacional dos deslocamentos, que inclui o planejamento operacional e sua gestão de tráfego”.

Outro fator decisivo é a engenharia de materiais. “Materiais com propriedades avançadas podem ter um custo inicial mais alto, mas garantem um tráfego mais fluido, consumo energético mais controlado, e manutenção simplificada. Por isso é crucial avaliar o ciclo de vida do sistema ou equipamento, desde a fase de projetos e aquisição, até o momento de descarte”, completa Holanda.

Financiamento e políticas públicas: as lacunas a superar

Apesar do seu potencial estratégico, o setor ferroviário ainda enfrenta gargalos significativos, especialmente no que diz respeito ao acesso a políticas públicas e fontes de financiamento verde.

“Outra dor do segmento é o tratamento desigual da ferrovia em relação a outros modais, ao não ser contemplado ou incluído em políticas públicas e financiamentos verdes, ou mesmo na dificuldade de conseguir financiamentos lato sensu”, destaca a consultora.

Nesse sentido, a publicação do Marco Legal do Transporte Ferroviário foi um divisor de águas, abrindo espaço para investimentos privados na construção de novas ferrovias, na recuperação de trechos abandonados e na operação de serviços logísticos.

Holanda também chama atenção para instrumentos financeiros já disponíveis que podem fomentar projetos ferroviários de longo prazo: 

“O REIDI, por exemplo, oferece isenção de PIS e COFINS. Temos ainda as debêntures incentivadas, que autorizam investidores a captar recursos no mercado, e as debêntures de infraestrutura, que complementam esse processo, ampliando as possibilidades de captação”, pontua nossa entrevistada.

Efeitos positivos em cadeia

Ao alavancar a infraestrutura ferroviária, não apenas se reduzem as emissões, mas também se criam empregos, renda e dinamizam-se cadeias produtivas. 

“Com o crescimento da infraestrutura, cresce a demanda por força de trabalho, que gera emprego e renda. Tudo isso culmina no maior escoamento de produtos da indústria nacional, potencializando a atração de investimentos para o Brasil”, resume Holanda.

Ela menciona ainda o novo PAC, que inclui projetos metroferroviários voltados para transporte de passageiros e cargas, e o papel do BNDES no apoio à transição verde: 

“O BNDES oferece financiamentos verdes com juros e prazos atraentes, incluindo o RETREM – Finem BNDES, que financia desde a reforma de material rodante até estudos e projetos.”

Sandra Holanda falará mais sobre o tema em um painel da NT Expo 2025, de 22 a 24 de abril, no Distrito Anhembi, em São Paulo. Garanta já sua participação para este evento imperdível do setor ferroviário!

O painel “Como a ferrovia pode ser a locomotiva da transição energética no Brasil?também terá a participação de Ellen Martins (ANTF), Renata Passos (International Railway Journal), Edson Dalto (BNDES), e Eduardo Scolati (GBMX).