A crescente digitalização das operações ferroviárias tem impulsionado ganhos em eficiência, conectividade e inteligência operacional. No entanto, esse avanço também traz novos desafios, especialmente no que diz respeito à proteção cibernética de infraestruturas críticas.
Foi com esse foco que o painel “Cibersegurança: a jornada para uma ferrovia mais inteligente e segura”, realizado durante o Congresso NT Expo, reuniu especialistas de diferentes áreas para debater riscos, vulnerabilidades e soluções estratégicas.
Sob a moderação de Luis Antonio Silveira Lopes, do Instituto Militar de Engenharia (IME), o painel contou com a participação de Felipe Thomé (Dfense Security), Cristiano Breder (Motorola Solutions), Paulo Eustáquio Coelho (Newon Engenharia) e Marco Spigliatti (Metrô de São Paulo).
Infraestruturas críticas e o impacto dos ataques cibernéticos
Cristiano Breder destacou que sistemas de missão crítica, como os utilizados em ferrovias, exigem monitoramento contínuo e respostas rápidas. “Hoje, os ataques são realizados com o uso de inteligência artificial. Não dá para depender apenas de humanos na defesa. Precisamos usar IA para combater IA”, afirmou.
Além da tecnologia, Breder reforçou a importância de processos bem definidos e equipes treinadas. “Muitas empresas não sabem quanto tempo levariam para recuperar seus serviços após um ataque. Isso é um sinal claro de baixa maturidade cibernética”, alertou.
Governança e maturidade estratégica
Felipe Thomé trouxe uma visão voltada à gestão de riscos e à maturidade organizacional. Segundo ele, 75% das empresas brasileiras ainda não atuam com planejamento estratégico em segurança cibernética. “O crime tem estratégia. As empresas precisam ter também. Investir apenas após um incidente é agir sob emoção, e isso compromete a efetividade da proteção”, explicou.
Thomé também destacou que a segurança digital deve ser tratada como um tema de alta gestão. “Cada ponto da operação ferroviária — da bilhetagem à vigilância — representa um vetor de risco. É preciso mapear e entender o apetite ao risco de cada área”, completou.
Casos reais e vulnerabilidades inesperadas
Paulo Coelho compartilhou experiências práticas que evidenciam como pequenas ações podem gerar grandes impactos. Um dos casos envolveu o uso de um simples speed test por um colaborador, que acabou paralisando uma fábrica ao interferir na banda de comunicação dos sensores industriais.
Outro exemplo foi o ataque originado de um dispositivo IPTV doméstico, que gerou tráfego malicioso suficiente para comprometer servidores de uma grande empresa. “Se o usuário não estiver treinado, não adianta ter tecnologia. O crime organizado está por trás desses ataques”, afirmou.
Riscos no transporte sobre trilhos
Marco Spigliatti trouxe a perspectiva do Metrô de São Paulo, destacando que os riscos não se limitam ao Centro de Controle Operacional. Sistemas de bilhetagem, comunicação digital e integração com outras plataformas são pontos críticos que exigem atenção.
Spigliatti relembrou casos internacionais, como os ataques em São Francisco e Sydney, que paralisaram o transporte público e causaram pânico entre os usuários. “Tudo que está interligado é uma preocupação. Precisamos isolar ao máximo e garantir a resiliência dos sistemas”, disse.
Postura cibernética: responsabilidade compartilhada
O painel também abordou a importância da postura individual na segurança digital. Breder provocou a plateia ao perguntar quantos tinham antivírus no celular — a maioria não levantou a mão. “Esperamos que as empresas façam tudo, mas não cuidamos nem dos nossos próprios dispositivos. A mudança começa com cada um de nós”, reforçou.
Soluções e caminhos para a proteção digital
Entre as estratégias apontadas pelos especialistas, destacam-se:
- Avaliação de risco: entender o grau de vulnerabilidade da empresa é essencial para definir prioridades.
- Testes de penetração (pentest): simular ataques com hackers éticos para identificar falhas antes que criminosos o façam.
- Normas técnicas: como a ISA/IEC 62443, voltada para ambientes de automação e infraestrutura crítica.
- Treinamento e conscientização: capacitar colaboradores para reconhecer e reagir a ameaças.
- Plano de contingência: garantir a continuidade dos serviços em caso de incidentes.
Segurança como pilar da operação ferroviária
O painel da NT Expo reforçou que cibersegurança é uma jornada contínua, que exige investimento, planejamento e envolvimento de todos os níveis da organização. Mais do que tecnologia, é preciso cultura de segurança.
A transformação digital trouxe eficiência, mas também riscos. E como bem resumiu Paulo Coelho: “Cibersegurança é como dirigir na neblina. Você precisa de visibilidade, preparo e atenção constante”, finaliza.
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